8 de jun. de 2012

a mutilação/ la berceuse


van gogh corta a orelha. como tudo é complicado! eu tinha comentado antes que, finalmente, após 600 páginas apresentando elementos, fios, temas em ordem mais ou menos cronológica, mais ou menos avulsos, que iam se entrelaçando apenas esporadicamente, após essas 600 páginas tudo começava a confluir e se entretecer de uma maneira fantástica (nas 300 ou 400 páginas iniciais, eu tinha ficado até um pouco aflita e nervosa, pensando como os biógrafos iam conseguir compor um retrato, uma figura humana mais densa). então nem dá mais para fazer aquelas chamadas que eu fazia antes, destacando um ou outro aspecto. pois são tantos, já apresentados antes, mas agora somados com uma habilidade fabulosa, que não tem como. mas acreditem: essas mãos abaixo são quase a gota d'água simbólica, com um peso existencial muito grande, que faz precipitar a grande crise das vésperas do natal de 1888 em arles, quando van gogh se mutila.

File:La Berceuse Augustine Roulin Otterlo.jpg

é que essa imagem acima não mostra direito: mas a berceuse está com uma corda na mão, que é como ela embala o berço (que não aparece mesmo na tela). nesta abaixo dá para ver melhor a corda. la berceuse vai virar o próprio símbolo da maternidade, e também o ícone da virgem maria protetora dos marinheiros - a corda é uma espécie de salva-vidas também - e um dos dramas da coisa é que a modelo, mme. augustine roulin, parou de vir antes que ele conseguisse terminar as mãos e a corda: como ele sempre foi péssimo para desenhar mãos, ainda mais de cabeça, e sempre teve problemas com a perspectiva, ficou essa incompletude das mãos e a corda meio frouxa, o que adquire para van gogh um peso tremendo de frustração sobretudo no plano simbólico.