30 de abr. de 2012

imperdível

o trabalho absolutamente incrível e fenomenal do museu van gogh e do instituto huygens, com a correspondência completa de e para van gogh com todos os seus correspondentes, em nova tradução anotada, comentada, com facsímiles etc.: aqui.

voltam os livros

van gogh, 1887, romances parisienses (sua famosa coleçãozinha das brochuras amarelas, uma das quais - la joie de vivre, de zola - já tinha aparecido na natureza-morta com bíblia, que comentei antes):



28 de abr. de 2012

a caveira

viva, depois de 640 laudas chegamos à metade da biografia de van gogh e ele finalmente chega a paris! 1886.

tinha feito pouco antes, ainda na antuérpia, um "autorretrato", na verdade um desafio meio cômico à academia - caveira de esqueleto com cigarro aceso:



27 de abr. de 2012

ringing a bell

saindo de nuenen no final de 1885 e indo para a antuérpia, começa a brutal decadência física de van gogh. que coisa: aos 32 anos, os dentes apodrecem (sífilis, tratamento com mercúrio etc.) e o dentista arranca 1/3 deles. lembrei-me de thoreau, a própria antítese de van gogh, tão virtuoso, casto e virgem, que com a mesmíssima idade de 32 anos também perde os dentes; no caso de thoreau, o dentista extrai todos. lembrei neste instante outro ponto em comum: a frugalidade e o vegetarianismo de ambos.

25 de abr. de 2012

fina-se o predomínio do negro


van gogh, final de 1885, pouco antes de sair definitivamente de nuenen: "o pungente adeus ao realismo"; tem início um simbolismo muito próprio e original, que já se esboçara em a torre da igreja velha de nuenen, feito meio na marra, por pressão de theo, e agora aparece mais claramente em natureza-morta com bíblia.


a historinha é muito legal, mas meio longa e entretecida demais para resumir aqui. em todo caso:
  1. a bíblia (o pai, a religião, o peso da autoridade, as páginas abertas em isaías cap. 53, a formalidade e o peso do volume, o texto ilegível e borrado, toques de duas complementares em contraste - azul e laranja - como uma espécie de vandalização do cinza dominante das páginas), 
  2. o livrinho (la joie de vivre de zola, ídolo de van gogh, brochura surrada, desleixada, mas com nome, autor, local de publicação cuidadosamente pintados e legíveis, o amarelo vivo da cor, o tamanhinho, a posição subordinada em relação ao volumaço da bíblia),
  3. a vela apagada, o sopro final, a despedida do "rayon noir", em suma, o adeus ao predomínio do negro.

24 de abr. de 2012

a paleta phebo

n'os comedores de batatasaquele cinza da parede é azul-prússia, alaranjado vivo (laranja cromo), vermelho orgânico, ocre amarronzado e amarelo-nápoles!

23 de abr. de 2012

phebo

diz van gogh sobre a paleta para comedores de batatas: "cor de sabonete escuro"! - alguém se lembra do antigo phebo?

20 de abr. de 2012

30 de março

caramba, que mapa astral! o primeiro vincent van gogh primogênito da família nasceu morto. o segundo vincent, que recebeu o mesmíssimo nome do irmãozinho natimorto, nasceu exatamente um ano depois, no mesmo dia em que ele nascera morto. tantos dramas, conflitos, exasperações, e o pai - a quem ameaçara com um trinchante na mesa de jantar - é enterrado precisamente no dia 30 de março, aniversário de van gogh, agora fazendo 32 anos. ufa.

a inspiração d'os comedores

vale a pena ver a inspiração para os comedores de batatas: a família camponesa de israëls, o grande herói dele. uma família camponesa à mesa é de 1882.

Resultado de imagem para israëls



muito interessante

uma coisa que achei muito interessante foi o seguinte: ele só desenhava a lápis e a pena. nesses primeiros anos fez uma brevíssima incursão pela aquarela e óleo, mas desistiu. aí, num dos arranca-rabos com theo, em 1884, fazem um acordo e ele começa a PINTAR cabeças (a série "cabeças do povo" ou de "gente do povo" ou o que seja). só que era pleno inverno, ele era um durango crônico, tinta a óleo e modelos eram caros, além do mais ele tinha a teima contra a cor (outra história interessante), e só podia gastar um florim por dia. 

então no inverno até conseguiu modelos porque os lavradores, artesãos e gente mais simples estavam sem trabalho e aceitavam aquele pagamento. só que no inverno os dias são curtos, e toda a questão dele com sombra e luz dependia da luz do dia no ateliê. então, por esse frenesi de dureza, teimosia e poucas horas de luz, ele pintava correndo, sem fazer esboço, contorno, nada, direto, e não tinha tempo nem de deixar a tinta secar, e pintava no molhado mesmo, borrando tudo: por isso o aveludado dos bistres e betumes sobre o preto, pois eram cores claras que se misturavam com os pretos e cinzas ainda molhados. um melê só - e tinha de ser toque muito leve e rápido para não virar lama, não empastar tudo. aí que todos aqueles anos de desenho, com a prática e leveza da mão em hachurar os desenhos, foram a maior mão na roda: pinceladas levíssimas, rapidíssimas, como se estivesse hachurando, mas com pincel, na tinta a óleo, e com as tintas molhadas! não é genial? fiquei arrepiada com essa explicação!

os comedores de batatas

a historinha do tão famoso comedores de batata: van gogh tinha passado uns quatro anos infernizando o irmão theo, inclusive com violentíssimas agressões verbais, e culpando-o por todas as suas desgraças, pois, entre outras coisas, achava que theo não divulgava nem expunha como deveria seus trabalhos na galeria de paris onde era gerente. aqui no livro, theo sempre foi um santo de paciência, mas a certa altura se encheu um pouco daquilo e falou: tá bom, então vou inscrever um quadro seu no salon (pois van gogh já se achava o tal, e o amigo dele, rappard, tinha exposto no salon e ele achava que podia expor tb). pois muito que bem: então theo falou, ok.

aí bateu o pânico no van gogh, pois claro que era tudo bazófia, chantagem emocional, aquela coisa toda, nem sabia ainda pintar a óleo, não dominava o desenho de figura etc.etc., mas, por mais que o irmão dissesse que ainda praticasse mais um pouco, ele já se dizia muito bom. na hora h, então, ele amarelou e tentou fugir: não, não é bem assim, são só estudos, só coisa para ver em ateliê, e isso e aquilo. bom, o irmão arregalou os olhos, mas não disse nada. aí o van gogh - que costumava passar muitas noites com sua namoradinha gordina, na casa da família dela, camponeses bem pobrezinhos - resolve fazer alguma coisa.

ainda por cima, é a época em que o pai dele morre (e, na opinião de todos, van gogh é que o matara). bom, mas aí ele vai e faz o quadro em menos de um mês (meados de abril a começo de maio de 1885). a história é toda bem mais complicada, mas então resulta aquela que é tida como uma de suas obras-primas, efetivamente o primeiro quadro que pintou. claro que todo mundo detestou e nem deixaram inscrever no salon, o que vai gerar mais um enésimo tsunami de fúrias, insultos, pragas e agressões, mas aí já é outra história. por ora fiquemos no die kartoffelesser:



18 de abr. de 2012

aiai

pelo visto, começa o recurso a objetos cortantes... outubro de 1884: durante a visita de seu amigo rappard, van gogh discute com o pai ao jantar, pega a faca de trinchar da travessa, levanta-se e o ameaça (acho que é mais loucurada e surto maníaco; jamais atacaria fisicamente o pai ou quem quer seja, penso eu).

16 de abr. de 2012

margot

aos 30 anos, van gogh resolve que agora quer ter "joie de vivre", vai ser galã e imitar o exemplo do cafajeste mouret, de zola. embeiça uma solteirona ricaça de 43 anos. uma sobrinha dela flagra os dois aos agarros, avisa a família, maior escândalo, van gogh diz que se casa com ela, mas família não aceita e decide mandá-la para utrecht. ela toma estricnina, vai se encontrar com ele às escondidas num campo perto da cidade, na véspera da partida. tem convulsões e quase morre. (ele chama um médico, ela se recupera, e mantêm intensa correspondência depois que ela se muda para utrecht. no final, depois que van gogh morre, ela acaba queimando as montanhas de cartas que ele lhe enviara - na casa da família era proibido pronunciar o nome dele).



15 de abr. de 2012

os vidoeiros decotados

março 1884 - primeira vez em que van gogh CAPTA a vida que não seja na figura humana: "Agora, na breve bonança das graças maternas, Vincent podia apenas olhar. Seus olhos encontraram e sondaram cada chaga nodosa, cada toco de galho decepado, cada penosa deformação. Captaram as rugas brancas e cintilantes da casca, a inclinação assimétrica de cada árvore, uma levemente diferente da outra. E dos nós escuros que marcavam os cortes mais recentes, captaram a exultação ascendente da retomada do crescimento – os galhos esguios que se estendiam aos céus, em busca do sol, elevando-se das ruínas mutiladas. Em filas e filas de árvores recuando até o fundo, repetiu o gesto triunfal, preenchendo a parte de cima do papel com camadas sucessivas de linhas verticais, gesto que reverberava em toda a parte de baixo, de lado a lado, em mil traços verticais da pena no capim, nos caniços, nos talos mais afastados."


algumas das conversas que rolaram no facebook:
Denise Bottmann esse tipo de poda se chama decote; tomara que as pessoas visualizem quando o texto fala em "bétulas (ou salgueiros ou whatever) decotadas"... quando eu era novinha, em são paulo era bastante usual decotarem as árvores das ruas, embora não essencialmente por causa da estação, mas mais para não atrapalhar os fios dos postes.
Tamara Barile agora que eu vi as duas figurinhas humanas, uma de cada lado, nem tinha visto antes - bétulas aparadas em decote funciona?
Denise Bottmann longo demais, não acha, Tamara ? olha o comentário dos biógrafos sobre as figurinhas (que eram um problema para ele, pois não conseguia desenhá-las direito, mas aqui ficou perfeita a solução): "Mesmo agora, na primavera de 1884, o domínio da figura era uma meta que ainda não conseguira atingir. Em outro desenho no mesmo mês de março, empenhou-se em desenhar a pena um grupo de quatro árvores decotadas ao lado de uma vala, logo além do portão do jardim. Mas, ao lado delas, acrescentou um homem empurrando um carrinho de mão – um andarilho rígido e sem rosto que trouxera do ateliê da Schenkweg, de uma época em que a solidão prevalecia sobre o olhar. Depois acabou acrescentando duas figuras ao desenho dos vidoeiros decotados – à direita, um pastor e seu rebanho; à esquerda, uma mulher com um ancinho ao ombro – mas estão longe, de costas, e quase somem atrás da grandiosa vitalidade ascendente das árvores mutiladas." bonito, né?
Karel Sobota Van Gogh é para mim O artista da pintura. Depois vem os outros :-) Eu morei por um ano na Holanda e enquanto estive por lá visitei muitos dos lugares da história dele, inclusive Neunen, pertinho de onde eu morava, Eindhoven, e visitei inúmeras vezes o Museu Van Gogh em Amsterdam, além de ver outros quadros dele em outros museus. Boa sorte na sua empreitada, e com certeza comprarei sua tradução quando for publicada! E não deixe de mostrar essas pilulazinhas de vez em quando :-)
Marco Silveira Mello Curioso, as árvores parecem caminhar em procissão, como perseguissem o mesmo norte que o pastor e o rebanho. Algo atrai todos para uma mesma direção, embora a figura feminina antes de caminhar levite.
Denise Bottmann legal, Marco! ele dizia tb: "uma fila de vidoeiros decotados às vezes parece uma procissão de moradores de asilo". ah, pls, querido, me diga: vc sabe como se chama aquele quadradinho de papelão com fios ou linhas como guias, que nas aulas de desenho a gente põe na frente do olho, para enquadrar a perspectiva?
Marco Silveira Mello Respondendo a sua pergunta, o aparelho atende pelo horroroso nome de perspectógrafo, também conhecido como a Janela de Leonardo.
Marco Silveira Mello Mais alguns nomes: "intersector de Alberti" ou "véu de Alberti", a "Finestra Leonardesca", a "Janela de Dürer" ou o "método da quadratura", de Villard de Honnecourt.
Denise Bottmann puxa, que legal, Marco - a ideia inicial é a do alberti mesmo, mas o van gogh aprendeu (mal e mal) umas benditas lições de desenho num manual infantil de um francês, armand cassagne, que recomendava o uso de um “cadre rectificateur”, que consistia num pequeno retângulo de papelão ou madeira, dividido por linhas em quatro retângulos iguais. depois ele acaba extrapolando um pouco (ele, van gogh) e encomenda uns quadros de perspectiva meio trambolhentos, com dez a doze fios intersectados, superincômodos de carregar, mas que tem uns pezinhos adaptáveis para terrenos irregulares (basicamente areia, para usar nas dunas de scheveningen). em inglês, dão como "perspective frame". em português, hoje vc encontra muito a expressão "grade de perspectiva", mas basicamente para programas (tipo corel), meio como tradução literal de gridded frame perspective. eu preferiria evitar esse tipo de anacronismo e descobrir como o pessoal de desenho e pintura chama essa bendita coisa, antes ou independentemente de programas digitais...

14 de abr. de 2012

idem


o escuro das imagens

por que van gogh em nuenen, de volta à casa dos pais, vai fazendo imagens cada vez mais escuras? porque não consegue dominar a perspectiva e, apesar de anos tentando, ainda não domina o desenho da figura humana. por isso reforça a escuridão dos ambientes, para não precisar se deter muito na representação dos traços. coloca os tecelões de lado, de perfil, de costas, rebatidos contra a luz de alguma janela etc. - 1884


13 de abr. de 2012

paisagem de drenthe

após tragédias e mais tragédias, cenas e mais cenas, brigas e mais brigas, van gogh está em drenthe, tipo um cafundó do judas holandês, à beira de seu primeiro surto psicótico. 1883. lápis, pena e pincel, com véu de aquarela em marrom e branco. paisagem de drenthe.


a querida marion pfeffer comentava o pesar que transmite essa paisagem. aí comentei: 
e vc acredita, marion, que a intenção desse desenho era demonstrar ao irmão theo a paz, a serenidade da natureza, a beleza do local ? pois vincent estava tentando convencê-lo a se mudar para lá. e é interessante como drenthe junta dois aspectos fundamentais: vincent nasceu e foi criado numa região de charneca (em zundert, no brabante, sul da holanda, divisa com a bélgica); ele e theo têm a charneca como uma espécie de referência vital muito profunda. aqui drenthe (norte da holanda, quase perto da fronteira prussiana) não é terra de baixada, como o brabante, mas é também pantanosa, só que de turfa. então essa vastidão de espaço, a desolação, a ausência de árvores, para eles não é muito triste, é uma natureza de "envolvência" existencial muito grande. mas, por outro lado, como drenthe vive da exploração da turfa, nisso acaba guardando semelhanças (sociais e econômicas) com o borinage, a região carvoeira francesa onde van gogh passou quase dois anos, quando queria ser pregador e pastor, e foi um período muito solitário, muito desvairado, extremamente trágico, quase indizível. então drenthe tem meio esses dois lados, ambos muito intensos: zundert e borinage; lar e alheamento etc.

11 de abr. de 2012

theo II

1887 - por muito tempo julgou-se que era um autorretrato. em 2011, estabeleceu-se por fim que era um retrato de theo van gogh:



theo

às vezes dá até dó do theo van gogh.


3 de abr. de 2012

livros

van gogh amava os realistas e naturalistas; aqui: Braves gens, de Jean Richepin, Au bonheur des dames, de Emile Zola, e La fille Elisa, de Edmond de Goncourt.


natureza-morta com livros é de 1887.

2 de abr. de 2012

dickens

por coincidência, falando ontem do dickens aqui, hoje van gogh descobre e adora.